sobre menino e lápis

O menino chegou cansado. Tarde toda no parque, correubrincouarcoflechabicicleta.
Chegou cansado, sentou. O pé, marrom. O rosto, suor. Sentou.
A noite queria chegar, vinha leve. Menino caçou ao lado lápis e, atrás, papel. Bloquinho que ali pousava. Eu no fogão.

Menino uniu papel ao lápis em franco silêncio. E foi vez primeira. E foi vez primeira.

– Mamãe!! Eu fiz um boneco! Eu fiz esse com a imagem de mim. Esse sou eu!!

Menino ria ria ria ria sorriso e espanto.
Vez primeira.

Riscos, círculos, cores, tudo isso já havia. Figura? Figura assim, com cabeça e olhos e dedos e pés? Não. Vez primeira.
– Que lindo, meu amor, que desenho mais lindo…!
– Obrigado, mamãe.. haha… obrigado mamãe!

A gente se abraçava. Tal qual a noite lá fora abraçava o dia, a gente se envolvia em uma felicidade cúmplice e leve. Estávamos entre espanto e encanto, ali, por desenho de menino. Assim, rabisco em papel branco com lápis de ponta ruim. Mão esquerda, mão direita, mão esquerda, menino tornou ao papel. Desenhou mais e descobriu no boneco uma barba, não, esse é o papai. E do lado, pequeno, esse sim sou eu.
Menino abria o caderno e os desenhos brotavam. Veio vó, vô, veio tio, tia. Veio foguete e boneco de neve ao lado da mamãe. Veio pedra. Veio tio escondido atrás de riscaria. Avião. Pássaro.
Menino concentrado concertava mundo ali, em papel e lápis. E até “os sem-nada” menino fez. E monstro. E mãos de bailarina.

O menino ficou ali tanto quanto durou o acordar. Eu em frente sentei. Não, não iria interromper rompante de menino. Apreciar, só.
Mandei mensagem para pai, que ali escorreu lágrima também. O menino, a chorar a gente.

Na geladeira pequena um vinho eu trouxe para fora – e eu que não sou de beber sozinha, ali fiquei. Gole ante gole. Traço após traço. O menino, encantado, tecia.

A noite lá fora já fazia estrela e lua quando menino disse deu, quero dormir, mamãe. O sono veio assim, maior que o traço. Guardou o caderninho para no outro dia seguir, para aos amigos mostrar, para o papai. Dormir, agora.
Deitamos, o sorriso seguia em rosto de menino. No meu, também lá sorriso e encanto seguia.

Das descobertas do mundo. Das belezas dos instantes. Das imensidões dos mundos que brotam em um crescer infantil.

*foto de pai de menino, com eles a correr-mundo..

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